A busca da Serenidade - Sêneca

Lucio Aneu Sêneca nasceu em Córdoba, na Espanha, no ano 1 da Era Cristã e foi o filósofo mais conhecido e popular de sua época, tendo escrito mais de 20 livros com conselhos práticos sobre todos os aspectos da vida. Ainda muito jovem, ele foi morar em Roma, onde passou a maior parte de sua vida e influenciou a política local como membro do Senado.

No ano de 49 d.C., Sêneca teve de assumir, contra a sua vontade, o cargo mais ingrato da administração do Império: o de tutor de um menino de 12 anos, Lucius Domitius Ahenobarbus, o futuro Imperador Nero. Logo ficou claro que Nero era um psicopata homicida. Sabendo que corria perigo, Sêneca tentou se afastar da corte. Por duas vezes, entregou ao imperador sua carta de demissão, tendo sido, em ambas, recusada com um abraço e o argumento de que Nero preferiria morrer a fazer mal a seu tutor. Porém, nada do que Sêneca presenciava o fazia crer nessas palavras. O palácio subterrâneo de Nero ajuda a explicar por que Sêneca se preocupava tanto com a ira. Nero era um homem com poderes absolutos. As pessoas eram trazidas para as câmaras subterrâneas de seu palácio e executadas em massa. Os romanos sofriam vários tipos de atrocidades, como serem atirados aos leões, decapitados, lançados aos crocodilos, desmembrados vivos etc. Vendo resultados tão tremendos da ira, Sêneca ficou desesperado para abrandá-la, pois um imperador romano tomado pela ira não era só uma visão desagradável, mas um fenômeno potencialmente catastrófico.

Sêneca considerava a ira a mais terrível e furiosa das emoções, mas recusava-se a vê-la como uma explosão irracional e incontrolável. Para ele, a ira era um problema filosófico que poderia ser tratado pela argumentação filosófica. A ira surge de certas idéias racionalizadas sobre o mundo, e o problema é que essas idéias são otimistas demais. Na visão de Sêneca, as pessoas ficam com raiva porque criam muitas expectativas. Num ataque de ira, as pessoas sentem-se surpresas e injustiçadas pelos fatos que, muitas vezes, não são surpreendentes nem injustos, mas, simplesmente, fatos cotidianos não considerados pelas expectativas erradas que elas têm em relação ao mundo. A vida é cheia de frustrações e a maioria das pessoas não parece capaz de reagir filosoficamente a elas.

Sêneca pensava que para ajustarmos nossa visão de mundo aos reveses da vida devemos ser mais pessimistas. Além disso, ele dizia que se aceitássemos que nada pode ser feito quanto às nossas frustrações, não vamos nos descontrolar tanto quando elas acontecerem. Sêneca acreditava que um dos motivos para nossa raiva é imaginarmos que as coisas sempre têm que ser como queremos, que somos capazes de moldar o mundo segundo nossos desejos. Mas não somos. Há muitas coisas que temos que aceitar, pois nem sempre temos liberdade para mudá-las.

Para Sêneca, é a razão que nos dá a capacidade de perceber o que podemos e o que não podemos mudar. Talvez não possamos alterar certos acontecimentos, mas podemos mudar nossa atitude em relação a eles. Era essa capacidade, para Sêneca, que conferia a liberdade que nos distingue como humanos.


Sêneca foi um homem rico e observando o mundo a sua volta fez uma análise interessante: constatou que a riqueza torna as pessoas ainda mais cheias de raiva e não mais calmas. “A prosperidade alimenta o destempero.”. Muitos de seus amigos tinham enormes casas de campo, com escravos para preparar banquetes que adentravam a noite. Sêneca conheceu um certo Vedius Pollio, alto funcionário do governo, que certa vez deu uma festa. Um escravo ficou encarregado de uma bandeja de copos. Num certo momento, o coitado teve o azar de tropeçar e derrubar a bandeja e os copos. Vedius Pollio ficou tão furioso que mandou atirar o escravo em um tanque cheio de lampreias, para que fosse devorado vivo. O que aconteceu, na análise de Sêneca, foi que Vedius Pollio vivia em um mundo em que copos simplesmente não podiam ser quebrados. O filósofo concluiu que o problema de ricos como Vedius Pollio, é que eles tinham expectativas absurdas.

A filosofia de Sêneca não é útil apenas em momentos de fúria. Ela sugere um meio de ficar sereno, controlado diante de qualquer adversidade. Sêneca pensava que todos reagem mal às frustrações, e só teríam a ganhar se reduzíssem as expectativas. Costuma-se confortar as pessoas dizendo que “tudo vai ficar bem”. Para Sêneca, essas palavras de suposto apoio podem ser cruéis, pois deixam as pessoas despreparadas para situações adversas. Ele recomendava a estratégia oposta: uma reflexão tranquila, mas diária, sobre tudo que pode dar errado. Sêneca pensava que, muitas vezes, superestimamos nossa capacidade de mudar os acontecimentos, de reverter situações frustrantes.

Foi no momento de sua morte que Sêneca se mostrou mais inspirador. A cena foi reproduzida infinitamente desde então, nas artes plásticas, na literatura e na música. Em abril de 65 d.C., foi descoberta uma conspiração contra Nero na qual Sêneca acabou incriminado, embora provavelmente fosse inocente. Nero enviou um centurião à residência do filósofo, para ordenar que ele se matasse imediatamente. Quando amigos e familiares souberam da sentença, caíram em prantos. Mas Sêneca não chorou. Foi sua atitude diante da desgraça que ajudou a definir o que ele queria dizer, ao afirmar que devemos ver as coisas filosoficamente. Calmamente, ele pegou uma faca e cortou os próprios pulsos. Sêneca morreu da maneira que nos aconselhava a viver. Como ele lembrou a uma amiga na ocasião da morte de seu filho: “Por que chorar por fatos da vida quando toda ela é motivo de lágrimas?”.

Fonte:
Parte I:
Parte II: http://www.youtube.com/watch?v=QgotcCkEEUk&feature=related
Parte III: http://www.youtube.com/watch?v=cQ08vIu8qJE&feature=related
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“Com sorte, nada de tão terrível irá ocorrer conosco. Mas coisas ruins podem acontecer, e a melhor maneira de amenizar os golpes, se eles vierem, é estarmos preparados. Ira e frustração são, em essência, reações irracionais aos reveses, e a única estratégia racional é manter a calma diante da constatação de que algumas coisas dão errado. Dessa maneira, estaremos agindo, no mais verdadeiro e melhor sentido do termo, filosoficamente” (Alain de Botton - Filósofo).
Agora, vamos pensar?
Como reagimos frente às frustrações da vida? Com raiva ou com serenidade?
Atualmente, fala-se muito em força do pensamento positivo, lei da atração, programação neuro-linguística etc. Será que somos capazes de cultivar pensamentos positivos sem criar expectativas erradas em relação ao mundo?
Boa reflexão.
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